Lílian Maial

Basta existir para ser completo - Fernando Pessoa

Meu Diário
27/10/2009 19h43
ERA VIDRO E SE QUEBROU... (CRACK)
ERA VIDRO E SE QUEBROU...   (CRACK)
®Lílian Maial
 


De maneira nua e crua, tomei ciência de que meu amigo poeta é o protagonista de um drama familiar indescritível. Vi o noticiário do pai que entregou o próprio filho à polícia, pela morte da namorada, durante surto de crack.

Aquele pai era o meu amigo poeta Luiz Fernando Prôa, um ativo representante da poesia carioca, que já vinha em árdua luta para tentar salvar o filho Bruno das garras do vício, desde tenra idade.

De pronto, coloquei-me em seu lugar, uma vez que também sou mãe de adolescentes, e pude avaliar a dor desse meu amigo poeta.
A dor do pai que percebe o filho diferente, que descobre seu vício relacionado ao álcool (droga lícita), depois a drogas ilícitas, inicialmente quase inócuas, para, logo depois, avançar para as mais pesadas e, finalmente, ao crack. 

 
A dor do pai que não consegue ajudar o filho de maneira incisiva, pois que não conta com aparato do Estado, e se vê só.

A dor do pai que entende que seu filho vai lentamente se perdendo na vida, e não pode impedir.

A dor do pai que se descobre, num fatídico dia, pai de um surtado que foi capaz de tirar a vida de quem lhe tentava ajudar, a quem amava.

A dor do pai que se entrega e enxerga que a única saída era entregar o próprio filho, para que pagasse pelo que fez.

A dor do homem envergonhado perante a família da vítima.

A dor do pai que sabe as dores que seu filho ainda passará.

A dor do pai que sente alívio por sua expectativa do pior ter um fim, porque o pior finalmente aconteceu.

A dor do poeta que vê seu melhor poema ser rasgado pelo trágico destino.

São muitas dores para um só homem, mesmo um poeta.
Há a dor da família da mocinha, certamente a dor da vida ceifada no seu desabrochar.  A dor da dor. Não há consolo, embora todos consolem.

E aquele homem, o “pai do assassino”, mas que é pai, que é homem de bem, que vinha lutando com as armas que possuía - esse homem não tem o consolo das famílias dos mortos, porque seu filho está vivo e foi, neste caso, o agente da morte. Mas ele é pai, e não há como deixar de sê-lo.
Ele sofre por todas essas dores por longos anos a fio.

Ele deve ter percorrido o caminho ao inverso, buscando onde foi que poderia ter sido mais presente, mais amigo, mais rigoroso, mais castrador, quem sabe?

Ele deve estar, mais uma vez, como em tantas outras, buscando a superfície, imerso no mar de inoperância do Estado, no assombro que é a vida nas grandes cidades, onde se convive com as tentações dos apelos da mídia convidando aos mais diversos vícios, onde se tenta desviar de balas perdidas, escapar de falsas blitz, sair e voltar para casa ileso, e encontrar os filhos também sem injúrias.

Aquele homem, aquele pai sou eu, é você, são todos os que estão do outro lado e, ao mesmo tempo, do lado de cá.

Não é o “pai do assassino viciado”, mas também uma vítima dos nossos tempos, um cidadão que não vê saída e não sabe e nem pode mudar a vida de um filho maior de idade, num país onde os dependentes têm que desejar a internação, mesmo quando, embora não alienados, estão incapazes de decidir sobre que rumo tomar.

Esta não é uma crônica político-social, muito menos uma tentativa de atenuar o acontecido. É apenas a manifestação de solidariedade às muitas dores de um amigo poeta, em solitária luta que, longe de chegar ao fim, ainda promete outras tantas mazelas e provações.

É apenas minha maneira de dizer que entendo o que você, poetamigo, está sentindo, essa fragilidade e esse cansaço, e oferecer meu ombro amigo para lhe amparar e dar forças para seguir adiante no resgate do seu menino.

Não podemos deixar a droga levar nossos meninos e meninas!

NÃO ÀS DROGAS!

NÃO À INDIFERENÇA DOS GOVERNANTES!

NÃO AO CONFORMISMO DOS QUE NADA TÊM A VER COM ISSO! UM DIA, PODE SER O SEU JARDIM A SER PISOTEADO.
 
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Publicado por Lílian Maial em 27/10/2009 às 19h43



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