Lílian Maial

Basta existir para ser completo - Fernando Pessoa

Meu Diário
27/05/2007 15h25
Depoimento de quem já abortou...
Pois é, falar de aborto parece que incomoda a muita gente. Baixíssima leitura no artigo e somente um comentário, e de um homem!
Enfim, nessa minha árdua tarefa de dizer o que penso e tentar clarear as coisas para homens e mulheres, publiquei esse artigo em uma revista eletrônica de grande divulgação, a Rio Total, em réplica a um texto do Artur da Távola.
Hoje cedo me chegou um e-mail surpreendente, de uma mulher de 85 anos, minha leitora, me dando total apoio nessa empreitada em favor da legalização do aborto, contando e autorizando a publicação de sua própria experiência, que segue abaixo. Não publicarei seu nome, mas transcreverei seu e-mail na íntegra:

"Lílian,

-Obrigada pelo seu artigo sensato e claro. Nenhum homem sabe o que significa uma gravidez indesejada. Para eles é fácil de falar em vida intra-uterina, etc. Eu tenho 85 anos. Antes que meu segundo filho nascesse, fiquei grávida. Eu e meu marido não estávamos em condição de criar mais um filho com dignidade. Nesta época vivi num país onde aborto era legalizado, fui e fiz o aborto num hospital com médicos e enfermeiras. Um ano depois engravidei de novo, desta vez estávamos muito felizes. Meu segundo filho, hoje com 58 anos, é um homem feliz e realizado. Tudo sem trauma, sem dores e sem remorso.
Isso aconteceu na Hungria, sob o regime comunista, mas mesmo lá somente a mulher é ouvida.
A gente, depois da primeira consulta, tem 3 dias para pensar. Depois se não mudar de idéia, faz o procedimento num hospital, com médico e enfermeiras, e 2 dias de internação.
Nao tenho nenhum trauma psicológico, isso é fábula para crentes de ouvir. Meu filho sabe da história e sabe que ele está vivo graças ao aborto que eu fiz antes dele."

Essa senhora de 85 anos não sente remorso ou vergonha, pq simplesmente foi uma opção lúcida e lógica. Ela estava bem casada, mas sabia que não poderia criar um filho com dignidade.
Agora vamos imaginar as mocinhas sem recursos, com famílias que não aceitariam a gravidez, ou até que aceitassem, mas com a condição de controlarem a vida da filha...
Ou as mulheres que usam contraceptivos, mas que naquele mês falhou, em um momento em que a gravidez não era uma opção.
Ou seja lá a situação que for, mas que a gestação não é bem-vinda.

Não estamos aqui incentivanmdo o aborto indiscriminado, apenas dando à mulher o direito de escolha sobre seu corpo e seu futuro, sem demagogia, hipocrisia, fanatismo e vendas nos olhos.

Chamo a atenção para o fato de que o Brasil é reconhecido mundialmente por seu avanço no tratamento e controle da AIDS, que não aconteceria, caso não se tivesse optado por enfrentar a igreja e seus princípios. Se isso não tivesse acontecido, até hoje nossos jovens estariam à mercê dessa praga.

O governo lança agora um Programa de Planejamento Familiar mais abrangente que, esperamos, vá ajudar bastante nos casos de gestações de adolescentes, mas sabemos que só isso não resolve o problema da gravidez indesejada.
Há que se lutar, sem paixões ou ofensas, pela legalização do aborto no país.

Afinal, faria apenas quem precisasse e quisesse...

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Publicado por Lílian Maial em 27/05/2007 às 15h25



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